Eram oito e meia da manhã quando me sentei num dos grandes bancos corridos da nave maior na igreja de Santa Cruz em Coimbra. Estava frio.
A luz da manhã nao conseguia entrar. Tudo era majestático e solene. Duas lâmpadas antigas de halogénio projectavam uma luz amarela, diáfana e improvável, sobre as lajes centenárias do corredor do templo, as madeiras austeras e a fé encanecida de quem parecia rezar.
Apenas os azulejos, que ladeiam as paredes laterais até à altura das arcadas das quatro capelas laterais, contrariavam aquele ambiente, solene e soturno, onde os crentes se escondiam da primavera. Estes mosaicos de século, embora baços e muito antigos, são a única claridade permitida.
Acompanham-me agora no lugar do culto, sentadas como eu, umas 40 pessoas. Estão todas vestidas de escuro. Envergam-no como um uniforme da fé, como um camuflado perfeito para quem já só encontra desconforto na claridade dos dias que lhes precipitam o tempo na centrifugadora do solstício.
Aqui dentro o relógio volteia mais rácido que um disco de vitrola, mas o tempo está suspenso como uma sentença sem lei.
As almas levitam. Não se pode estar mais perto de Deus