Paro na meia tarde de estio e rezo. Afinal há igrejas bonitas por aqui.
Logo à entrada pergunta-se aos turistas “se visitam”, não porque rezar há-de ser coisa vedada a quem procura fresco recolhimento no interior da nave, mas porque visitar – embora também confira o direito a praticar orações – rende à caixa de esmolas guardada pelo porteiro da Sé Nova de Coimbra, um euro por cada fiel encalorado.
“É tanto” pede um amador, pelo menos improvisado, letreiro, indistintamente, a quem reza, a quem se abriga do estio ou a quem só está visita.
Depois de almoçar com um dos mais notáveis – talvez o único – pós-fascista-proto-comunista vivo, apeteceu-me rezar. Há pessoas que te inspiram sensações incríveis e inesperadas. Quando isso acontece não deves hesitar.
Foi aqui que a ideia de igreja me surgiu. Na ausência de vaga para estacionar a banheira negra em que habitualmente me desloco, deixo-a na segunda fila de uma baia improvisada na frente da escadaria exterior ao templo.
Marcava 37 centígrados o termómetro.
Decidi então deixar o carro ligado, com os quatro piscas acessos, e corri para dentro do Colégio das Onze Mil Virgens – assim foi batizada a Sé na sua origem – na esperança da tal oração fresca e rápida sob os auspícios simétricos do grande arquiteto Baltazar Álvares, à época do final do séculos de quinhentos, o pedreiro oficial dos Jesuítas.
Mas ainda não tinham terminado de subir os degraus da escada já, debaixo da canícula, um cavalheiro me interpela sobre o lugar abusado onde por minutos descansava parado o automóvel.
– Não pode deixar ficar o carro aí! Olhe que o Padre está a chegar… respondi que até deixava o carro ligado com a chave lá dentro e tudo, para que o fresco não fugisse e porque ia rezar depressa.
– Não pode ser, rematou ele, avançando decidido sob o sol escaldante no labirinto dos carros que ocupavam a praça… não pode rezar assim!
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